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30.6.06 

La Moneda (Lisboa)

A má moeda

Uma vez tentaram vender-me um sofá por seis mil euros. Mas eu não estava a "comprar um sofá", dizia a arquitecta, estava a "comprar um conceito. Porque hoje um sofá já não é apenas um sofá". Pois não.
Também no mundo da comida há muitos restaurantes que já não são apenas restaurantes. São um conceito. Invariavelmente ficam na moda, invariavelmente o serviço é demorado, invariavelmente a comida é uma porcaria, invariavelmente acabam por fechar.
No La Moneda, o conceito é o “food and movement” (tipo McDrive ?!). Nas paredes são projectados slides de quadros e cadernos de viagem de artistas, "num ambiente que nos transporta para o imaginário de paraísos desconhecidos" – ou qualquer outra lamechice deste género que se pudesse ler na badana da ementa, ou naqueles textos de revistas e jornais que adoram promover restaurantes-conceito.
E não há pior do que a mistura restaurante-galeria-de-arte, que parece, contudo, ir fazendo algum sucesso.
Numa sala escura, bastante público sexualmente diferenciado e alguns casais convencionais. Destaco dois colegas de trabalho a fazerem jus ao conceito de food and movement. Primeiro, analisaram uns relatórios "lá da empresa" e ela fazia um ar interessado, rematando sempre o levantar de sobrancelhas inteligente com um "completamente". Ele explicava os números. Tal como tinham dito em casa, estavam num jantar de trabalho. No fim, sem papéis, e com algum vinho, a conversa era pegajosa, o copo circulava nos dedos e ela trincava o lábio enquanto o ouvia. Ele pagou. Adoraram o La Moneda e vão voltar. Mas não se lembram do que comeram. Mas eu lembro: cozinha do mundo, adocicada e a saber sempre a gengibre.
Ceviche - que é um prato da América-latina, da costa do Pacífico, de peixe marinado em lima, cebola, coentros e tomate - levemente interessante, e desajustado na sala sombria; lombo de vitela com cogumelos portobello e crosta de legumes, criativamente chamado lombo-bello!, tenro mas sem graça, nem verdadeira crosta; um crepe malaio de corvina, gambas e gengibre e coco, enjoativo; corvina com escamas de cogumelos (a ligação peixe cogumelos corre quase sempre mal, e não foi esta que correu bem).
No La Moneda, tenta-se fazer cozinha de fusão (que por esse mundo é tão novidade e tão na moda como o Renault 19 Chamade), mas faz-se cozinha confusão: exagera-se no doce, no número de ingredientes por prato, no querer ser diferente.
As sobremesas estão um ponto acima do resto (aliás, li algures que o dono/cozinheiro considera mesmo que no seu restaurante as entradas e as sobremesas são melhores do que os pratos…): destaco a tarte de chocolate e a mousse de papaia com um bom gelado de manjericão e lima.
O serviço é coerente: empregados bonitos, simpáticos e ineficientes trazem os pratos na hora certa. Ou melhor, uma hora certinha depois de terem trazido o anterior. E os preços são altos, mesmo se os não compararmos com a qualidade.
Felizmente, a lei de Gresham não se aplica na restauração: os maus restaurantes acabam por se expulsar a si próprios. Como a loja do sofá dos mil e duzentos contos, que hoje é uma agência do Banif.

Melhor: Sobremesas.
Pior: A confusão de sabores.
Pontuação: Sem estrela
(Sem estrela - De incomestível a come-se; * - Bom; ** - Muito Bom; *** - Excelente; **** - Excepcional)
La Moneda, Rua da Moeda, 1 C, Lisboa, Tel: 213 908 012, 10h00 – 02h00, encerra Domingo, aceita cartões, 35€/pessoa.

Contraprovador

  • Lourenço Viegas, 54 anos, é geólogo e crí­tico gastronómico. Colabora semanalmente na Time Out Lisboa. Nasceu em Lourenço Marques e vive no Ribatejo. Tem duas filhas.
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