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23.4.08 

Stravaganza (2/6)

Straganza

É normal, no trânsito da vida, passarmos duas vezes pelas mesmas pessoas. Um segundo casamento com a mesma mulher, uma criada que torna de França para voltar a servir, um colega da instrução primária que acaba por ser gestor de conta no balcão da caixa agrícola.Mas há também pessoas que não nos saem da frente. Como o Restaurante Stravaganza, que me tem sido sempre ser sugerido para irmos jantar. Muda o alguém. Mantém-se o restaurante. Sina minha. Triste sina. Ir jantar ao Bairro Alto para alguém com mais de vinte anos e menos de setenta (hiato durante o qual reduz drasticamente o interesse por adolescentes púberes bêbadas ao ponto de se ponderarem com objectividade os riscos de assalto) implica uma boa explicação. No meu caso, um bom restaurante. E bons restaurantes não abundam por aqueles lados. Pelo menos que valham os risco de assalto.Nisso está a grande vantagem do Stravaganza: o ser mesmo ali à bica, à entrada do Bairro, sem termos que nos afastar muito da cidade. Sem irmos para fora de pé. Entra-se e tem uma rampa. Gosto de rampas, mas nenhuma bate a do restaurante Ladeira, na 5 de Outubro. Entradas mistas. Prato grande, roda dos alimentos ao molho, o salmão com camarões em cima, a tocar no melão com presunto e no carpaccio.Tortelloni di magro mantecati, ou seja, requeijão e espinafres sem piada, molho desmaiado, textura sem história. Um pizza banal, que não estava má, mas ali deslocada. É tudo assim, sem história. Sem chama.O pior tipo de restaurantes, para um crítico é o restaurante em que se come mal, por muito dinheiro, mas em que se é bem atendido. Falta aquela pedra do empregado rude a massacrar no sapato, a fazer ver quão mau estava o risotto de cogumelos, sem sal e mal cozido, a prova de que é um restaurante italiano em Lisboa, que não serve italianos e que talvez não queira servir lisboetas. Preços caros, empregados simpáticos, lista gigante. Demora. Demora. Dizem-me os meus amigos professores que é como dar uma má nota a um aluno burro, simpático e trabalhador. Não concordo. Nisto dos empregos, não há nada pior do que um burro que trabalha. Pior que um burro que trabalha, meu filho, dizia-me um tio major, são dois burros que trabalham.E com as sobremesas na boca, fruta bem cortada, doces normais pensar que ó valeu a pena uma coisa: uma pasta de cozedura correcta al dente, com gambas de tamanho generoso e consistência muito saudável, que dá gosto trincar até ao fim, uma dose graúda de alho, bom azeite, temperatura certa. Com algum interesse uns raviólis com pêra e queijo de cabra, os sabores bem misturados. Delicado, escorregadio, luzidio. Suave.De resto notas negativas, ou comida sem nota. E é este o momento em que se vê o que vale o serviço num restaurante. Não é quando é bom ou mau. É quando é bom o serviço e mau o restaurante. Restaurante quer dizer carta comida preço. O Stravaganza é um restaurante com pouco sentido.O pormenor galetiano da lista com duas colunas de preços, uma, mais barata até às 20h30 e outra mais cara após essa hora é o cúmulo do anti-marketing. Como que a dizer que o casal norueguês reformado, que janta às sete, paga menos do que o segurança do Almada Fórum que quer surpreender a namorada, mas só pode ir jantar às nove. E depois a dúvida se o até às oito e meia é hora de sentar, de pedir, ou de pagar. O litígio potencial. Naquela lista gigante de pratos sem sentido.

Stravaganza
R. do Grémio Lusitano, 20 (Bairro Alto)
**Mau
TimeOut, n.º 29, 16ABRIL2008

Contraprovador

  • Lourenço Viegas, 54 anos, é geólogo e crí­tico gastronómico. Colabora semanalmente na Time Out Lisboa. Nasceu em Lourenço Marques e vive no Ribatejo. Tem duas filhas.
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