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28.2.08 

Cop'3 (5/6)

Por arriscar um caldo verde

Não é possível ser-se bom sem se ser, ao mesmo tempo, mau. Não há Zidane sem cabeçada no italiano, nem Roma sem trânsito, nem Bárbara sem Carrilho. Fazer melhor implica arriscar, arriscar implica falhar. E estas banalidades de livros motivacionais em dez lições para gestores de meio da tabela são das maiores verdades que se aplicam a um restaurante. Penso em pratos falhados, pratos que morrem na mesa. Estudar com dúvida, realizar com fé, já dizia o outro.
O creme de couve-flor com vieira e azeite trufado do COP’3 foi um desastre. Sem sal, sem sentido, a vieira ali perdida naquele lamaçal branco e doce, que nem as trufas, presentes no nariz, ausentes na boca, resgataram. Foi a primeira coisa que me entrou na boca. Vai ser bonito, vai. Tudo o negativo foi realçado: a toalha manchada, o serviço burocraticamente lento. Por outro lado, um mau começo também nos exige que não se baixe a bitola dos outros pratos.
Afinal o teaser que me lá tinha levado era o caldo verde mais caro do mundo. Sete euros sete. Caldo verde. Portuguese green soup. A sopa que deu o nome à própria couve. Como o kispo, a gilete, o blackanddecker. Metonímias de malga.
Confesso – sei que este estilo seminarista do confesso atrai e repele – que raramente arrisco um caldo verde fora de casa. Casual sex, casual caldo verde, podem correr muito mal. Caldo verde é a mais difícil das sopas. Toda a cozinheira acha que o sabe fazer, mas a proporção raramente está certa. Às vezes puré de batata com umas farripas de couve migada perdidas, outras relvados de couve entremeados de grânulos de batata. Às vezes frio, às vezes a escaldar (a temperatura no caldo verde é fundamental). Mas o caldo verde do COP’3 foi (escrevo, não escrevo?) o melhor caldo verde que comi: harmonia perfeita, textura, temperatura, couve. Boa escolha de chouriço ao lado, previamente tostado, sobre fatia de broa. Se a textura é só de batata, se tem qualquer coisa misturada (arroz?), não sei. Mas não interessa.
Carpaccio bacalhau com molho de tasca, muito agradável, sem preponderância ofuscante de nenhum elemento. Raviólis de gambas interessantes, mas sabor demasiado desinfectado nos cogumelos hospitalares.
O caldo verde tinha desfeito as dúvidas. Os pratos iam ser bons. Na cozinha, havia alguém que sabia mexer em comida comida e que se esforçava por melhorar (não apenas reinventar) pratos nacionais.
Um excelente cherne em sopa, caldo muito aromatizado, legumes e, entre estes, feijão papo de rola (a voar do pestana palace para ali), o príncipe dos feijões.
Um lombo de corpo muito macio, bem cozinhado, a lascar, com pimentão e açorda de amêijoas a rechear.
Mas nada do que tenho comido ultimamente – excepto uns peixes há umas semanas no Sobral – têm sido tão bons como o cachaço de porco. No tamanho certo, cozinhado lentamente, com couve e feijão num jus muito puxado. O cachaço a derreter, as migas a envolverem. Podem dizer: o Viegas adora porco. Adora, é certo. Mas isso só aumenta a exigência.
E até se esquece que se está no Santos Design District, que é um nome que significa lojas com empregados arrogantes a venderem peças de design, pelas quais temos que esperar quarenta e cinco dias, a um preço quarenta e cinco por cento superior ao que das mesmas peças em Nova Iorque, ou na internet. Bom leite creme de lemongrass, que não seria pior se fosse normal.
O COP’3 (nome abarcelonado, mas que não deixa de ter lá atrás um Axel Foley) ganhava em diminuir a ementa e a lentidão do serviço. De resto, que se mantenha o espírito de ir experimentado pratos com os clientes e o serviço despretensioso. Talvez menos op-art e mais tradição nas sobremesas. Mas isto é apenas o crítico que quer um sítio para ir jantar fora nas folgas. Lourenço Viegas

COP’3
*****Muito Bom
Largo Vitorino Damásio 3 – Lisboa, (Santos)

Time Out 22, 27 FEV 08.

Contraprovador

  • Lourenço Viegas, 54 anos, é geólogo e crí­tico gastronómico. Colabora semanalmente na Time Out Lisboa. Nasceu em Lourenço Marques e vive no Ribatejo. Tem duas filhas.
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