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9.2.10 

de Castro (4/5)

Juntando a inexorável passagem do tempo, a finitude do homem, a inconstância da mulher e o preço do metro quadrado em Lisboa, não teremos que todos os restaurantes são circunstanciais, coisas sujeitas a passar? Os restaurantes de hoje não serão todos as parafarmácias de amanhã?
A circunstância é o aqui e agora. E aqui e agora faz todo o sentido o restaurante de Castro, na Elias Garcia. É o restaurante certo, à hora certa, no local certo. Em Lisboa, há poucos sítios de fronteira, como o de Castro, em que se come bem, por pouco dinheiro, sobretudo se estivermos a falar de uma comida simples, que nos atira sempre para locais de luz de bloco operatório, ementas em plástico em que já-não-temos os únicos pratos que apetecem. O de Castro está no local certo, precisamente porque está numa zona de Lisboa onde não se pode comer simples sem ser mal, nem bem sem ser demorado ( e bem aqui é relativo, é o Polícia), ou pizzas (La Finestra).
Junto à Gulbenkian, no fim da Elias Garcia, pode comer-se a qualquer hora entre o meio-dia e a meia-noite. E só isso já é notícia. Num país que odeia horas e adora horários (horários de afixar na porta, horários de fecho, bem entendido), um restaurante que não fecha e onde não há trombas se quisermos comer às seis da tarde, sem termos de ver os empregados a jantarem na mesa do fundo e ser servidos por favor, é uma coisa espectacular (como o chefe associado ao restaurante é do Porto, uso aqui um adjectivo que se ouve mais no Porto do que “isso” no Brasil).
As iscas do cachaço de bacalhau são cubos panados de uma carne de bacalhau com mais gordura do que o habitual, muito boas. A maionese de camarão e ovo é simples e agradável, para picar. As amêijoas com feijão manteiga são uma combinação interessante, mas já apanhei o prato mais consistente e com as amêijoas menos feitas do que das últimas vezes. Excelentes pezinhos de coentrada, desfeitos e desossados, em papa com coentros, ligeiramente avinagrados. O bolo de chocolate sem farinha pesa pouco, mas esfarela um pouco. O toucinho do céu é bom, mas vem com gelado (ou seria o bolo de chocolate? Ou ambos?). O gelado está hoje para as sobremesas como a cenoura ralada para a comida de cafeitório (sim, querida, sei que me tem pedido que invente palavras, tome lá esta), e é sempre quem não pede a coisa que come o acessório, que está ali para que se não diga que não está, mas sem qualquer sentido. Sei que exagero, que muita gente acha espectacular que tudo venha com uma bola de gelado. Até gelado de morango vem com uma bola de gelado de baunilha a acompanhar. Mas tenho sempre fé em que as pessoas aprendam.
No de Castro da Elias Garcia o serviço é simpático, mas tem falhas. Dizia a minha tia, não sirvas a quem serviu (cruel verdade), mas nisto dos restaurantes é mais não sejas servido por quem não serviu, com muitos esquecimentos, timings errados, paragens absortas. Nada de grave, mas a precisar de chicote.
É um restaurante em que se consegue boa comida por preços (realmente) baixos, onde ninguém parece importar-se que apenas se vá lá picar e beber um copo de vinho, um restaurante que não fecha. Enfim, tão pouco português que parece mentira.
Lourenço Viegas

de Castro
Av. Elias Garcia, 180 B (junto à Gulbenkian)
Lisboa

Contraprovador

  • Lourenço Viegas, 54 anos, é geólogo e crí­tico gastronómico. Colabora semanalmente na Time Out Lisboa. Nasceu em Lourenço Marques e vive no Ribatejo. Tem duas filhas.
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